Sobretaxa dos EUA acentua queda da carne no mercado brasileiro

Redução de valores na exportação gerou uma reação em cadeia, derrubando a arroba do boi gordo e a cotação dos cortes no atacado.

Tempo de leitura: 3 minutos

| Publicado em 24/07/2025 por:

Engenheira Agrônoma | Analista de mercado

O anúncio da sobretaxa de 50% dos Estados Unidos a produtos brasileiros acentuou a queda nos preços da carne bovina no mercado interno. Analistas e frigoríficos indicam que não há volumes “sobrando” em decorrência da sanção americana, mas a pressão de importadores, que reduziram os preços pagos pela tonelada exportada pelo Brasil, gerou uma reação em cadeia. A arroba do boi gordo recuou e, em consequência, a carne bovina no atacado também caiu.

O preço da carcaça casada bovina no atacado paulista, corrigido pelo IGP-DI, saiu de R$ 21,03 por quilo no início do mês para R$ 19,50 ontem, segundo a consultoria Agrifatto . Do dia 9 de julho, quando o presidente Donald Trump anunciou a sobretaxa, até ontem, a retração foi de 5,01%.

Já o indicador do boi da Datagro Pecuária, referência para os contratos na B3, passou de R$ 313,12 a arroba para R$ 295,18 por arroba no acumulado de julho. Desde o dia 9, a queda foi de 4,16%.

Fonte de uma empresa que exporta carne aos EUA relatou, sob anonimato, que, poucos dias após o anúncio de Trump, os importadores americanos pediram para os frigoríficos suspenderem a produção de carne que seria enviada ao país devido às incertezas. Se a sobretaxa entrar em vigor em 1 de agosto, contratos devem ser cancelados.

Apesar disso, não há perspectiva de demissões nas empresas por redução na operação. Isso porque os frigoríficos, em geral, já estão negociando e fechando novos contratos com compradores como Egito, Filipinas, Irã e Rússia, embora a preços menores. “Egito, por exemplo, pagava US$ 4.850 por tonelada de dianteiro e passou a pagar US$ 4.500”, afirmou a fonte.

A despeito do preço mais baixo, as indústrias precisam fechar esses contratos para conseguir ampliar as vendas aos atuais clientes e fazer com que o mercado absorva os volumes que iriam aos EUA.

Segundo a fonte do frigorífico, isso tende a acontecer, pois os exportadores já vinham buscando pulverizar as vendas desde que a taxa adicional de 10% dos EUA contra o Brasil, entrou em vigor em abril, o que levou a tarifa da carne brasileira ao mercado americano para cerca de 36,4%.

“O mercado sem os EUA não é uma coisa boa, mas equaliza muito rápido. Só não será uma crise passageira se o preço do boi não acompanhar [e subir]”, afirmou a fonte.

A diretora da Agrifatto, Lygia Pimentel, acredita que a tendência é a carne continuar pressionada no curto prazo no atacado.

O pesquisador Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), Thiago Carvalo, acrescenta que já havia uma conjuntura de baixa para o produto, com férias escolares, inadimplência da população e oferta maior de boi gordo proveniente do chamado primeiro giro de confinamento.

Redirecionamento

Supermercadistas e redes de atacarejo veem algum espaço para o redirecionamento ao Brasil de carnes que seriam enviadas aos EUA, mas acreditam num efeito limitado em preços. Isso por conta das estratégias de exportação a outros mercados, já em andamento, e da possibilidade de estocagem de cortes que podem ser congelados.

Segundo três cadeias de varejo que estiveram com a linha de frente de Friboi e Marfrig nos últimos dias, já há tratativas para envio de carne que iria aos EUA para países como China, Indonésia, Egito e México. E, nas mesas de negociação no Brasil, neste momento, as marcas não acenam com novas tabelas com preços mais baixos.

Mas varejistas entendem que isso é parte do processo de negociação, e que será difícil que países de Ásia e Oriente Médio consigam absorver as toneladas que não forem enviadas aos EUA pela perda de competitividade com o tarifaço.

“Se você pensar, mesmo que o volume que a Friboi manda daqui aos EUA seja pequeno para ela, para o mercado é representativo, então é difícil redirecionar de uma só vez para fora”, disse o presidente de uma grande rede de atacarejo.

“Os frigoríficos precisam de um equilíbrio entre preço e volume, por isso, achamos que o mercado interno deve receber algo. Só que não está claro o tamanho disso e se o efeito em preço será relevante”, disse a mesma fonte. De janeiro a junho, a carne no Brasil já caiu 0,65% pelo IPCA/IBGE.

Um segundo executivo, CEO de uma cadeia que esteve com a direção de Friboi e Marfrig, disse ontem que a empresa do grupo da JBS esperava dobrar o volume exportado aos EUA neste ano, e que eles reduziram as expectativas. “Boa parte do boi que eles exportam aos EUA são o dianteiro do boi, menos nobre, e parte vira hambúrguer. Não é tão fácil distribuir isso a outros mercados, então logo algo vai acabar ficando no Brasil se essa tarifa de 50% permanecer”, afirmou ele.

Procuradas, Friboi e Marfrig não comentaram.

O diretor de Sustentabilidade da BRF/Marfrig, Paulo Pianez, afirmou ontem, em evento, que o tarifaço não gera impacto direto nas operações da companhia no Brasil, mas causa um “desarranjo” na economia e uma relação de “perde-perde” para os envolvidos. (Colaborou RW, de Brasília)

Globo Rural

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