No RS, seca ‘encolhe’ pés de soja e tira mais de R$ 13 bi da economia

Calor e falta de chuvas derrubaram produtividade do grão no Estado.

Tempo de leitura: 4 minutos

| Publicado em 12/03/2025 por:

Engenheira Agrônoma | Analista de mercado

A estiagem castigou as lavouras de Marcos Pedrotti, que produz grãos em Sarandi (RS). A colheita de soja nos 85 hectares do produtor começará na semana que vem, e ele está pessimista: Pedrotti estima perder de 35% a 40% da produção. “Em um ano normal, eu deveria colher entre 65 e 70 sacas para hectare”, disse ele, “mas nesta safra, devemos colher 25 sacas a menos”.

O relato do produtor é um resumo da frustração geral no Estado. O Rio Grande do Sul, que há menos de um ano sofreu com inundações sem precedentes, agora faz as contas de quanto vai perder não com o excesso de chuvas, mas com a falta delas.

Ontem, durante a programação da Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque, uma das principais feiras agrícolas do Estado, a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-RS) informou que a seca vai causar uma quebra de 30% na produção de soja no Rio Grande do Sul em relação à estimativa inicial, de 21,6 milhões de toneladas. Em uma área de plantio de 6,7 milhões de hectares, quase a mesma do ciclo anterior, a produção chegará a 15 milhões de toneladas.

Em 2023/24, a produção da oleaginosa foi de 18,2 milhões de toneladas. Isso significa que, caso a nova previsão da Emater se confirme, a colheita da atual temporada será 17,4% menor do que a da anterior, que, como consequência direta das enchentes, já havia tido uma quebra de quase 3 milhões de toneladas.

A seca afetou o desenvolvimento dos pés de soja no campo, o que fica evidente para quem percorre a região centro-norte do Rio Grande do Sul, onde ficam municípios como Passo Fundo, Carazinho, Sarandi e Não-Me-Toque. Nas áreas em que faltou chuva, as plantas estão mirradas, e não “caneludas”, segundo o jargão local: como não tiveram água suficiente para crescer, as vagens da parte inferior da planta estão, em muitos casos, rentes ao chão, e não com um bom pedaço de caule (a tal “canela” da planta) a distanciá-las do solo.

Um dos efeitos colaterais de uma planta que cresceu com pouca água, segundo agrônomos que o Valor consultou na Expodireto, é a piora das condições de colheita. A curta distância entre o solo e o primeiro conjunto de vagens impede os agricultores de fazer o ajuste correto nas máquinas colheitadeiras, que acabam deixando muitos grãos pelo caminho quando passam para fazer a colheita.

Falta de chuvas é também sinônimo de grão de baixa qualidade. Sem água, a soja não “enche”, e as vagens, que costumam ter, em média, quatro grãos cada uma, desenvolveram-se com três, ou, nos casos mais extremos, com apenas dois grãos.

“Além da falta de chuvas, as lavouras sofreram também com o forte calor, principalmente nas últimas duas semanas”, disse André Debastiani, sócio-diretor da Agroconsult, em palestra que fez, a convite da Basf, a produtores que visitaram a Expodireto.

Na estimativa que apresentou no mês passado, a consultoria projetou que as lavouras de soja do Rio Grande do Sul vão encerrar a temporada com produtividade média de 39 sacas por hectare. O resultado já seria, de longe, o pior do país — para Mato Grosso do Sul, o Estado que deve ficar na vice-lanterna do ranking de produtividade, a Agroconsult estimou rendimento de 49,5 sacas por hectare —, mas o número vai cair um pouco mais: a empresa vai atualizar suas projeções neste mês.

“Será daí [39 sacas por hectare] para menos”, afirmou Debastiani. No relatório que apresentou ontem, a Emater estimou que a produtividade média no Estado será de 37,3 sacas por hectare.

As regiões oeste e sul do Rio Grande do Sul foram as que mais sofreram com a falta de chuvas, segundo Claudinei Baldissera, diretor técnico da Emater-RS. “No leste do Estado, onde choveu com mais regularidade, algumas áreas terão produção até acima da média, mas, no oeste, a colheita de muitas lavouras ficou até inviável”, disse.

A quebra da safra de soja, a principal cultura agrícola do Rio Grande do Sul, poderá levar a perdas de R$ 13,5 bilhões na economia do Estado, de acordo com Baldissera. “Se incluirmos outras culturas, esse valor pode subir para R$ 14 bilhões”, acrescentou.

Somadas todas as demais culturas de verão (milho, arroz e feijão), a Emater estima que a produção de grãos será de 28 milhões de toneladas na safra 2024/25. O volume representa uma queda de 6,6% em relação à colheita de 2023/24, que foi de 30 milhões de toneladas.

A falta de chuvas tem prejudicado as plantações e também a oferta de água à população — em algumas em comunidades do interior, o abastecimento já depende de caminhões-pipa. Segundo a Defesa Civil, 211 municípios do Estado já decretaram situação de emergência devido à estiagem.

As dificuldades econômicas dos produtores rurais do Rio Grande do Sul foram o assunto mais recorrente na cerimônia de abertura da 25 Expodireto Cotrijal, na segunda-feira (10/3). No ato, autoridades e lideranças setoriais destacaram a necessidade de securitização das operações de crédito rural para os agricultores e pecuaristas que tiveram perdas com os problemas climáticos.

Nei César Manica, presidente da Cotrijal, cooperativa que organiza a feira em Não-Me-Toque, lembrou que, nos últimos cinco anos, os produtores do Rio Grande do Sul enfrentaram três estiagens consecutivas, chuvas devastadoras e, agora, uma nova seca.

“Precisamos alongar os pagamentos, construir uma solução para esse problema”, disse. “Mesmo que o Brasil tenha uma das melhores safras de história do Brasil neste ano, o Rio Grande do Sul terá uma de suas piores colheitas”.

Globo Rural

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