O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC) decidiu, mais uma vez, manter a taxa básica de juros inalterada. Como esperado por economistas e agentes do mercado financeiro, a Selic permanece em 10,50% ao ano.
A novidade que sai da reunião desta quarta-feira (30), no entanto, foi o tom mais duro do comunicado.
Economistas destacam que, desde a última reunião do Copom, houve uma importante desvalorização do câmbio e nova piora das expectativas de inflação, que obrigaram o Comitê a ser mais “hawkish”, jargão do mercado para a postura mais agressiva com a condução dos juros.
O comunicado desta quarta reforçou a perspectiva de que o colegiado pode voltar a subir a taxa Selic se julgar necessário. O Comitê afirmou que “segue vigilante” e que eventuais ajustes na taxa básica seguirão o “firme compromisso” da instituição em convergir a inflação à meta.
“A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária”, diz trecho do documento.
Por que o Copom endureceu o discurso?
A função primordial do BC, quando decide alterar a taxa básica de juros, é manter a inflação do país sob controle. Para dar um norte à missão, o Conselho Monetário Nacional (CMN) define uma meta para a inflação, que hoje é de 3%.
A meta é considerada cumprida se estiver no intervalo de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Assim, uma inflação dentro da meta pode variar de 1,5% a 4,5%.
O indicador mais recente de preços ao consumidor é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15), chamado também de prévia da inflação oficial do país. Em julho, o IPCA-15 registrou um avanço de 0,30%, acima das expectativas dos analistas (0,23%).
Na janela de 12 meses, o indicador acumulou uma alta de 4,45%, já bastante próximo ao teto da meta do BC. O cenário acendeu um alerta entre os economistas de que talvez os juros do país não estejam conseguindo segurar a inflação.
Se no começo do ano os economistas do mercado financeiro previam que o Brasil fecharia o ano de 2024 com inflação de 3,90%, o último boletim Focus — relatório do BC que reúne as análises de mais de 100 instituições financeiras — mostra que as expectativas subiram para 4,10% nesta semana.
Para 2025, a estimativa de inflação do boletim Focus também avançou de 3,90% para 3,96% nesta semana. Ambas estão, portanto, acima do centro da meta. É o que economistas chamam de “desancoragem das expectativas de inflação”.
Com as apostas do mercado se afastando dos 3%, o Copom tenta reforçar o compromisso de que pode até subir os juros para redirecionar as expectativas para a meta de inflação.
O que mudou nas expectativas de inflação?
Para os críticos da condução da política monetária por parte do BC, não é ideal que o Copom se baseie tanto nas metas de inflação para ajustar o patamar de juros. Mas a interpretação da diretoria é de que as expectativas de inflação costumam contaminar a economia real, impulsionando os preços.
E economistas ouvidos pelo g1 apontam que o balanço de riscos que influenciam as expectativas de inflação piorou bastante desde a última reunião do Copom, em junho.
O dólar teve valorização expressiva, o mercado de trabalho brasileiro pode gerar pressão nos preços, cresceram as dúvidas sobre o controle das contas públicas por parte do governo federal e persistem as dúvidas sobre como será a forma de agir da próxima diretoria do BC.
Do começo de junho para cá, o dólar acumula uma alta de cerca de 8%. Há uma junção de fatores internos e externos que levaram o câmbio a esse cenário.
Por aqui, pesou bastante a série de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a condução de política monetária do BC, além dos episódios em que relativizou a necessidade de reavaliação dos gastos públicos.
Quando Lula decide atacar o BC, o mercado se preocupa com quem será o sucessor de Roberto Campos Neto. O mandato do atual presidente da instituição acaba em dezembro, e há receio de que o indicado possa ceder às pressões do governo.
Mas outros fatores importantes também têm entrado na conta do dólar, como a expectativa pelos cortes nas taxas de juros dos Estados Unidos, a incerteza sobre as eleições presidenciais americanas e a situação das contas públicas brasileiras, em meio ao desafio do governo de buscar o déficit zero em 2024.