A maior seca em 20 anos no Norte do Brasil pode encarecer a importação de fertilizantes que chegam pelos portos da região para atender os produtores do Centro-Oeste. Com a redução do nível dos rios, os portos do chamado Arco Norte enfrentam problemas na navegação, o que deve gerar desvio de rotas de embarcações para outros terminais, aumento de custos e potenciais atrasos de entrega.
Em Porto Velho (RO) — uma das quatro Estações de Transbordo de Carga (ETC) em operação no rio Madeira — não há navegação no momento porque o nível do rio está “negativo”, afirma João Petrini, especialista em logística e fertilizantes da agência de inteligência de mercado, Argus.
No último dia 10 de setembro, o nível do Madeira nessa região era de 79 centímetros, segundo medição do Serviço Geológico Brasileiro — redução de 27 centímetros em uma semana e abaixo da mediana para o período, de 352 centímetros.
Diante desse quadro, o fertilizante que está em trânsito, vindo do exterior, até os portos do Arco Norte deve entrar em uma fila quando chegar, atrasando a entrega aos produtores, diz Petrini.
O Arco Norte não é a principal rota de entrada de fertilizantes no país, mas tornou-se uma opção ao demandado Porto de Paranaguá. E vem aumentando sua participação. De 2020 a 2024, a importação de adubos por essa via mais que dobrou, saindo de 1,5 milhão de toneladas no primeiro semestre de 2020 para 3,7 milhões de toneladas no primeiro semestre deste ano, segundo a Argus.
A participação nas importações está em 20,8% — Paranaguá é a principal via de entrada do produto, com fatia de 30%.
Na avaliação de Petrini, a situação nos portos do Arco Norte pode levar a um aumento significativo dos custos com “demurrage” ou a desvios a outros portos do país, se o volume de água dos rios diminuir ainda mais.
Numa eventual paralisação do transporte hidroviário na região, as opções de desvio para escoamento dos fertilizantes seriam o porto de Itaqui, em São Luís (MA), e os terminais do Sul e Sudeste do país, afirma o especialista.
De acordo com o diretor-geral da Antaq, Eduardo Nery, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) tem realizado dragagens emergenciais para garantir a circulação de carga via barcaças, mas a navegação de navios maiores já está comprometida.
“Para navegação em barcaças que exigem até 3,5 metros de profundidade, a dragagem resolve o problema. Mas para aquelas embarcações que exigem calado maior, de sete a nove metros, o transporte está no limite, já não passa em alguns trechos do rio Amazonas e em breve ficará totalmente impossibilitado”, observa o executivo.
Ao todo, 330 mil metros cúbicos de sedimento já foram dragados por três equipamentos de sucção e recalque operando no rio Madeira desde agosto. A previsão, segundo o diretor-geral da Antaq, é de que sejam dragados 1, 3 milhão de metros cúbicos até o fim deste ano.
“A solução para não ter desabastecimento é fazer o transbordo em estações flutuantes e as embarcações seguirem na navegação por barcaça”, afirma Nery. Com essas intervenções, a expectativa da Antaq é que não haja interrupção na navegação. Contudo, o impacto no custo logístico é inevitável.
Em junho, o frete de grãos na rota Sinop (MT) a Miritituba (PA) atingiu R$ 278 por tonelada, estável em relação ao mesmo período de 2023. O frete de fertilizantes na rota de retorno Miritituba-Sinop ficou em R$ 143 a tonelada neste ano, acima de R$ 137 no ano passado, segundo a Argus.
Nery, da Antaq, diz que as dragagens são importantes para mitigar e manter a navegação, mas reconhece que não será possível escapar dos impactos na perda de eficiência e no custo de transporte.