O mercado global de fertilizantes tem assistido a movimentos atípicos, como a restrição da oferta de fosfatados (com concentração de fósforo). As flutuações eram esperadas em função de gargalos logísticos, mas não havia a previsão de escassez na produção global. Parte dessa limitação tem origem na China, um dos principais produtores globais do produto. Com prioridade para abastecer o mercado doméstico, as exportações chinesas têm sido restritas no mercado externo.
Levantamento feito pela Argus, especializada em relatórios e análises de preços para o mercado de combustíveis, agricultura, fertilizantes, gás natural e petroquímica, aponta que as restrições na oferta de fosfatados pela China devem ficar mais frequentes. Com a diminuição da oferta do fertilizante chinês, o preço do insumo tende a subir no mercado global. E o Brasil – que não é autossuficiente na produção de fosfatados – é impactado pelo comportamento do mercado nos Estados Unidos.
“A disponibilidade reduzida de fosfatados nos EUA fez com que compradores adquirissem mais TSP, um fertilizante à base de fosfato que não é amplamente utilizado no país. A disponibilidade de TSP também é restrita no Brasil. Com a produção da China mais frequentemente voltada para o mercado doméstico, o volume do fertilizante chinês disponível para o Brasil diminuiu”, observa Renata Cardarelli, especialista em Agricultura e Fertilizantes da Argus.
Soma-se a esse cenário o aumento da demanda por fosfatados no Brasil. Havia uma expectativa, segundo dados coletados pela Argus, de que o preço dos fertilizantes fosfatados diminuísse em função da oferta da produção chinesa. Como esse movimento não se concretizou, o preço do insumo subiu no mercado, provocando mudanças também para os produtores rurais no Brasil.
Segundo Cardarelli, há uma procura muito grande por fosfatados no mercado brasileiro no pré-plantio da safra de soja. Por outro lado, as restrições de oferta da produção chinesa e a manutenção dos preços do insumo russo têm impactado o comportamento de compra dos agricultores brasileiros.
“Nos últimos anos, temos observado os agricultores brasileiros postergarem a decisão de compra, deixando para adquirir o produto mais perto da janela de aplicação. Eles esperam o preço do fosfatado baixar e uma melhor cotação da oleaginosa”, diz Cardarelli.
Produção com hidrogênio verde
A produção brasileira de fertilizantes tende a se transformar até 2030, com a entrada em operação de fábricas da Petrobras (PETR4) e inauguração de outras plantas com investimento privado. No início do ano, a Atlas Agro deu mais um passo para a construção da fábrica de fertilizantes nitrogenados a partir do hidrogênio verde, em uma área que ultrapassa 1 milhão de metros quadrados no Distrito Industrial 3 de Uberaba (MG).
Com investimento total de R$ 4,3 bilhões, a fábrica deve entrar em operação entre o fim de 2028 e início de 2029, e tem potencial para reduzir em 2,5% a dependência de importação total de fertilizantes do Brasil. A expectativa é de que a nova fábrica gere cerca de dois mil empregos na fase de construção, com duração de 36 meses. A partir do início da operação, a previsão da Atlas Agro é criar cerca de 540 empregos diretos e indiretos.
Entre fevereiro e junho, a Atlas Agro finalizou a primeira fase do projeto de engenharia e construção, que incluiu a contratação de dois consórcios. Nos próximos 12 meses, será desenvolvido o projeto executivo de engenharia (FEED), e as construções devem ser iniciadas em segundo semestre de 2025.
A meta, segundo a Atlas Agro, é produzir 500 mil toneladas por ano de fertilizantes nitrogenados. Toda a produção será destinada ao mercado doméstico, portanto, não há planos para exportar parte da produção.
“A nossa planta em Uberaba vai ser a primeira fábrica de fertilizante hidrogenado com 100% de produção a partir do hidrogênio verde no Brasil”, afirma Rodrigo Santana, diretor de operações da Atlas Agro.
Santana observa que a produção atual de fertilizantes nitrogenados utiliza hidrogênio, porém de origem fóssil, elaborado a partir do gás natural e carvão. A inovação será possível pelo uso de eletrolisadores mais potentes. Esses dispostivos permitem quebrar as moléculas da água em átomos de oxigênio e hidrogênio.
“Substituiremos o hidrogênio cinza pelo hidrogênio verde, a partir da eletrólise da água. O processo já existe há algumas décadas. A grande diferença agora é que, com a capacidade maior dos eletrolisadores, há um ganho enorme de competividade da tecnologia”, ressalta.
O Brasil importa 95% dos fertilizantes nitrogenados e, com a guerra entre Rússia e Ucrânia, houve uma pressão ainda maior dos produtores rurais brasileiros, pois havia uma enorme preocupação de não haver fertilizante para a agricultura, diz Santana. Esse contexto favorece o desenvolvimento de uma indústria local de fertilizantes verdes e amônia verde.